9/05/2008

Síndrome

Todas as vezes que a tristeza, a angústia e a depressão me ameaçam, penso no universo.

Penso, por exemplo, que se a Inteligência que calibrou sua velocidade tivesse se atrasado em um milésimo de segundo, a terra e tudo que nela habita simplesmente não existiria. Que magnífica precisão!

Existe por trás de tudo uma misteriosa, inexplicável, encantadora e extasiante perfeição!

Penso também que o segredo de um enigma está em suas próprias palavras.

Cada um de nós é fruto de um experimento único da natureza. Em virtude disso todo o nosso modelo existencial não é coerente com a felicidade.

E se de repente resolvemos cavar nossa própria sepultura, esse é um direito que nos assiste. Não há nada que possamos fazer para mudá-lo.

Penso ainda que seria muita pretensão de nossa parte a idéia de que pudéssemos salvar o planeta e sua biodiversidade. Até porque não precisam que o façamos por eles.

Nós - humanos - é que precisamos de salvação. O resto se salva sozinho.

A biodiversidade ressurgirá sempre, ainda que sob outras formas.

A vida obedece a princípios que estão muito além da nossa limitada capacidade de compreensão.

O planeta continuará vivo, pelo menos por mais alguns bilhões de anos, até que a morte do sol faça dele apenas uma pequena esfera carbonizada, a deslizar no vazio escuro, silente e frio dos espaços siderais.

Somos os mais frágeis dentre todos os seres. Os mais desesperados.

Temos consciência da vida e da morte, e as relacionamos com nossa capacidade para sentir. Já na natureza não há sentimentalismos.

Temos o passado e o futuro para nos atormentar, enquanto o animal irracional tem diante de si apenas o rigoroso presente.

Temos necessidades demais.

Comemos muito mais do que nossos corpos precisam.

Precisamos de muitas roupas e muitos sapatos. De casas enormes.

O tratamento de nossa saúde requer estruturas sofisticadas.

Não conseguimos mais viver sem toda a parafernália tecnológica.

Nossos carros precisam ser mais possantes e luxuosos.

Se não temos mais necessidades, nós as inventamos. Inventaremos sempre. Temos ciências especializadas nessa nobre arte.

Lutamos contra o tempo para permanecermos jovens, e para nosso desespero ele sempre vence.

Fazem-se plásticas, botam-se silicone para mudar anatomias. Afinal, é na supervalorizaçã o da imagem que viceja a contemporaneidade.

A imagem de um homem é valorada pela fortuna que acumula e pelo número de cópulas que executa durante sua curta existência; e da mulher pela capacidade de atrair para si o maior número possível de machos. (Os que não conseguem são vistos com desdém - são os fracassados! )

O desejo de cada um pelo prazer efêmero perpassa o outro como mero objeto de satisfações pessoais. Explora-se, suga-se, extrai-se dele tudo que se pode.

A competição é incentivada. A ordem é sobrepujar-se ao outro.

Quando vencemos ficamos felizes e superiores.. .

Mas logo depois sobrevém o permanente e insaciável vazio, mudando o rumo das paixões, fazendo avultar de novo a miséria sob todas as suas forma, imensa e terrível como antes.

E o ciclo recomeça.

Somos assim como os bambus que se curvam ao capricho dos ventos.

E o que mais se pode esperar de uma raça pensante que age assim, a não ser que anseie - consciente ou inconscientemente - pelo auto-aniquilamento?

A História demonstra claramente que a decadência e a morte de uma civilização começa nela mesma, vem de dentro para fora, pela erosão dos seus valores éticos e morais.

Mas tudo isso, a cada dia me interessa menos.

Estou aqui só de passagem.

Interessa-me sim os segredos do universo, o pensamento e os desígnios de Deus.

Entretanto, este alheamento das causas terrenas, das caudas reais, econômicas e concretas, não é frio.

Lutamos e lutaremos sempre por um mundo melhor. Continuaremos fazendo a nossa minúscula parte, com amor e zelo. Mesmo porque não conseguiríamos viver de outra maneira.

Todavia, o que não se deve é acreditar que o êxito da empreitada esteja em nossas mãos. Este é o erro fatal!

A tentativa sempre estará em nossas mãos, mas o êxito, jamais!

Você pode viver triste e abatido, ou viver alegre e feliz: são decisões como esta que ninguém mais pode tomar por você.

Há mais de dois mil anos um pensador muito sábio - talvez o mais sábio de todos - resumiu numa singela frase a saída definitiva para todos os dramas humanos:

"Meu reino não é desse mundo!".

E isso é algo que o nosso amigo Edward O. Wilson, assim como muitos daqueles nos quais ele busca apoio, dificilmente descobrirão.. .

Afonso Sebastião do Carmo
afonso@cooxupe.com.br

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